1. Jesus: Filho, observa com diligência os movimentos da natureza e da graça: pois são muito
opostos uns aos outros e tão sutis que só a custo podem ser discernidos, mesmo por um
homem espiritual e interiormente iluminado. Todos, sim, desejam o bem e intentam algum
bem nas suas palavras e obras; por isso se enganam muitos com a aparência do bem. A
natureza é astuta; a muitos atrai, enreda e engana, e não tem outra coisa em mira senão a si
mesma. Mas a graça anda com simplicidade, evita a menor aparência do mal, não usa de
enganos, e tudo faz puramente por Deus, no qual descansa como em seu último fim.
2. A natureza tem horror à mortificação, não quer ser oprimida, nem vencida, nem sujeita,
nem submeter-se voluntariamente a outrem. A graça, porém, aplica-se à mortificação
própria, resiste à sensualidade, quer estar sujeita, deseja ser vencida e não quer usar da
própria liberdade: gosta de estar sob a disciplina, não cobiça dominar sobre outrem, mas quer
viver, ficar e permanecer sempre debaixo da mão de Deus, sempre pronta, por amor de Deus,
a se curvar humildemente a toda criatura humana. A natureza trabalha por seu próprio
interesse e só atenta no lucro que de outrem lhe pode advir. A graça, porém, pondera não o
que lhe seja útil ou cômodo, mas o que a muitos seja proveitoso. A natureza gosta de receber
honras e homenagens; a graça, porém, refere fielmente a Deus toda honra e glória.
3. A natureza teme a confusão e desprezo; mas a graça alegra-se de sofrer injúrias pelo nome
de Jesus. A natureza aprecia a ociosidade e o bem estar do corpo; a graça, porém, não pode
estar ociosa e abraça com prazer o trabalho. A natureza gosta de possuir coisas esquisitas e
lindas e aborrece as vis e grosseiras; mas a graça se compraz nas simples e modestas, não
despreza as ásperas, nem recusa vertir-se de hábito velho. A natureza cuida dos bens
temporais, alegrase por um lucro pequeno, entristece-se por um prejuízo e irrita-se com uma
palavrinha injuriosa. A graça, porém, cuida das coisas eternas, não se apega às temporais,
não se perturba com a sua perda, nem se ofende com palavras ásperas; porquanto pôs o seu
tesouro e sua glória no céu onde nada perece.
4. A natureza é cobiçosa, antes quer receber do que dar; gosta de ter coisas próprias e
particulares. Mas a graça é generosa e liberal, foge de singularidades, contenta-se com pouco
e considera "maior felicidade o dar que o receber"( At 20,35). A natureza inclina-se para as
criaturas, para a própria carne, para as vaidades e passatempos. Mas a graça nos conduz a
Deus e às virtudes, renuncia às criaturas, foge do mundo, detesta os apetites carnais, restringe
as vagueações e peja-se de aparecer em público. A natureza gosta de ter qualquer consolação
exterior com que deleite os sentidos. A graça, porém, só em Deus procura seu consolo e se
delicia no sumo bem, mais que em todas as coisas visíveis.
5. A natureza tudo faz para seu próprio interesse e proveito, nada sabe fazer de graça, mas
espera sempre, pelo bem que faz, receber outro tanto ou melhor em elogios ou favores e
deseja que se faça grande caso de seus efeitos e dons. A graça, porém, não busca nenhuma coisa temporal, nem deseja outro prêmio, senão Deus só, e do temporal não deseja mais do
que quanto lhe possa servir para conseguir a vida eterna.
6. A natureza preza-se de muitos amigos e parentes, ufana-se de sua posição elevada e
linhagem ilustre, procura agradar aos poderosos, lisonjeia os ricos, aplaude os seus iguais. A
graça, porém, ama os próprios inimigos, não se gaba do grande número de seus amigos, não
faz caso de posição e nobreza, se lhes não vê unida maior virtude. Favorece mais ao pobre
que ao rico, tem mais compaixão do inocente do que do poderoso, alegra-se com o sincero, e
não com o mentiroso. Estimula sempre os bons e maiores progressos, para que se
assemelhem, pelas virtudes, ao Filho de Deus. A natureza logo se queixa da penúria e do
trabalho. A graça sofre com paciência a pobreza.
7. A natureza atribui tudo a si, em proveito seu peleja a porfia. A graça, porém, atribui tudo a
Deus, de quem tudo dimana como de sua origem; nenhum bem atribui a si com arrogante
presunção, não questiona, nem prefere a sua opinião à dos outros, mas em todo juízo e
parecer se sujeita à sabedoria eterna e ao divino exame. A natureza deseja saber segredos e
ouvir novidades, quer exibir-se em público e experimentar muitas coisas pelos sentidos;
deseja ser conhecida e fazer aquilo donde lhe resultem louvor e admiração. A graça não
cuida de novidades e curiosidades, porque tudo isso nasce da corrupção antiga, pois nada há
de novo e estável sobre a terra. Ensina, pois, a refrear os sentidos, a evitar a vã complacência
e ostentação, a ocultar humildemente o que provoque admiração e louvor, busca em todas as
coisas e ciências proveito espiritual e a honra e glória de Deus. Não quer que a louvem, nem
às suas obras, mas que Deus seja bendito em seus dons, que ele prodigaliza a todos por mera
bondade.
8. A graça é uma luz sobrenatural e um dom especial de Deus; é propriamente o sinal dos
escolhidos e o penhor da salvação eterna, pois eleva o homem das coisas terrenas ao amor
das celestiais, e de carnal o torna espiritual. Quanto mais, pois, é oprimida e dominada a
natureza, tanto maior graça é infundida, e tanto mais cada dia é renovado o homem interior,
conforme a imagem de Deus.
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